Poliamor solo? Não monogamia ética? As lições sobre amor e sexo de 2022.
Este ano não foi diferente. Grande parte dessa influência se espalhou online, especialmente em comunidades que se identificam no espectro LGBTQIA+.
Ao mesmo tempo, a autorreflexão conduzida ao longo da pandemia de covid-19 continua abalando, em efeito cascata, o mundo dos relacionamentos de forma geral, resultando em mais práticas intencionais. Com isso, as pessoas passaram a pensar mais sobre quem e como gostariam de namorar.
Por que as relações abertas estão cada vez mais comuns Por que algumas pessoas se arriscam vendo pornografia durante o trabalho.
Em 2022, este movimento fez com que mais pessoas se afastassem abertamente dos padrões binários de gênero e atração.
Vimos pessoas ainda mais dependentes da internet para encontrar possíveis parceiros, para o bem e para o mal.
E as pessoas passaram a se expressar cada vez mais sobre a experiência de diferentes tipos de relacionamentos, desde o poliamor solo até parcerias de vida platônicas.
Afastando-se dos padrões binários.
Na cultura ocidental, os relacionamentos, o gênero e a sexualidade, há muito tempo, são definidos por padrões binários. Ou o casal está namorando, ou não está; alguém é atraído por mulheres ou por homens, a pessoa é homem ou mulher.
João Fellet tenta entender como brasileiros chegaram ao grau atual de divisão.
Mas, nos últimos anos, esses padrões binários ficaram cada vez menos arraigados e mais pessoas vêm observando as orientações sexuais e identidades de gênero de formas diferentes. E este processo foi especialmente marcante em 2022.
Com relação à orientação sexual, o gênero de uma pessoa perdeu relevância para muitos em busca de um parceiro, especialmente no caso de muitos millennials e jovens da Geração Z em seus relacionamentos íntimos.
Para alguns deles, o gênero passou até a ser um dos últimos itens da lista do que eles desejam em um parceiro. Isso é especialmente válido para pessoas que se identificam como queers ou pansexuais, o que significa que suas atrações românticas e/ou sexuais são independentes do gênero.
Ella Deregowska tem 23 anos de idade e mora em Londres. Ela afirma que identificar-se como pansexual permitiu a ela mover-se "com maior fluidez e aceitar cada atração que sinto sem achar que preciso reconsiderar minha identidade ou rótulo para explicá-la".
Especialistas afirmam que o aumento da abertura para atrações não-binárias, em parte, está relacionado ao crescimento da sua representação em meios populares.
Há desde programas de televisão como o canadense Schitt's Creek , em que o ator Dan Levy interpreta o personagem pansexual David Rose, até celebridades como a cantora e compositora norte-americana Janelle Monáe, que se identificou com a pansexualidade.
Não foi apenas a orientação sexual que se afastou dos padrões binários neste ano. Outros jovens (e celebridades) também se afastaram dos binários para descrever seu gênero.
Identificar-se como não-binário ou de gênero fluido permite que muitas pessoas se expressem de forma mais autêntica, sem classificação rígida entre uma definição e outra.
"Um dia, eu acordo me sentindo mais feminina e posso talvez vestir um top curto e usar brincos. E há momentos em que meio que preciso do meu binder [colete para minimizar o volume dos seios] porque não estou me sentindo daquela forma", afirma Carla Hernando, que tem 26 anos de idade e mora em Barcelona, na Espanha.
Mas, com cada vez mais pessoas rompendo os padrões binários de gênero e sexo, namorar ainda pode ser um campo minado para as pessoas que se identificam como não binários.
Desde aplicativos de encontros que exigem gêneros binários até pessoas que forçam parceiros não binários a adotar papéis de gênero, nem toda a sociedade aderiu ao movimento para afastar-se das normas de gênero binário.
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Em 2022, os padrões binários ficaram menos arraigados. Mais pessoas examinaram suas orientações sexuais e definições de gênero.
Desafiando cada vez mais os tabus e tradições.
No ano passado, os relacionamentos entre os jovens sacudiram ainda mais as normas arraigadas da sociedade.
Particularmente, a Geração Z adotou a zona cinza do namoro, entrando intencionalmente em "situações".
Essas conexões satisfazem a necessidade de companhia próxima, intimidade e sexo, mas não dependem necessariamente de objetivos de relacionamento de longo prazo — em vez disso, eles ficam em algum ponto entre um relacionamento fixo e um encontro ocasional.
Segundo a professora de sociologia Elizabeth Amstrong, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, que estuda esses tipos de relacionamentos, os jovens da Geração Z acreditam que "a 'situação', por alguma razão, funciona no momento. E, no momento, não vou me preocupar em ter algo que 'dê em alguma coisa'."
De forma geral, a abertura para muitos tipos de relacionamentos não tradicionais também ganhou visibilidade.
A não monogamia ética está espalhada pelo TikTok, muitas vezes na forma de relacionamentos poliamorosos, envolvendo mais de dois parceiros românticos e sexuais que moram juntos.
Existem ainda as relações abertas, que podem variar desde parceiros que se encontram com outros casais até aqueles que têm relacionamentos separados com outras pessoas além dos seus parceiros primários.
Há também as pessoas póli que preferem viver sozinhas, adotando o estilo de vida do "poliamor solo". Elas moram sozinhas, mas se dedicam a diversos relacionamentos comprometidos.
E outras preferem morar junto com parceiros platônicos, formando relacionamentos duradouros e até adquirindo casa e planejando o futuro com amigos próximos, em vez de amantes.
Mas, apesar de tudo isso, muitos mitos e tabus de relacionamento sobreviveram e provavelmente irão permanecer.
O constrangimento por ser solteiro, por exemplo, continua forte desde o início da pandemia, quando uma pesquisa do serviço de encontros Match concluiu que 52% dos adultos solteiros do Reino Unido sofreram constrangimento pela sua falta de relacionamento amoroso.
E as pessoas ainda condenam o ator Leonardo DiCaprio e muitas outras pessoas pelos seus relacionamentos com grande diferença de idade. Também persistem mitos como a ideia de que "os opostos se atraem", ainda que, muitas vezes, não seja a realidade.
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Separar-se, por um lado, ficou mais fácil em 2022. Os coaches de divórcio se popularizaram, aconselhando os casais até mesmo quando as finanças os mantinham juntos.
Rompimentos são difíceis — ainda mais com covid e economia.
A maior tranquilidade entre diferentes formas de namoro não facilitou os rompimentos.
Muitos casais que floresceram com as restrições da covid-19 sentiram muito essa dificuldade em 2022.
Depois de começarem a namorar em "bolhas de casais" durante os lockdowns, muitos estão enfrentando dificuldades para adaptar-se a relacionamentos em condições mais normais. E alguns casais que se deram bem só entre eles não se adaptaram ao mundo real.
Em 2022, vimos também soluções para casais que estão à beira do rompimento. Coaches de divórcio vêm ajudando os casais a atravessar as dificuldades de saúde mental nos seus rompimentos, do Reino Unido até o Canadá.
Esses coaches representam uma mudança rumo à normalização da procura por auxílio terapêutico em tempos de alto nível de estresse e ao longo do processo de divórcio.
"Divorciar-se não é mais visto como falha de caráter ou fracasso na própria vida", segundo a psicóloga clínica Yasmine Saad, fundadora dos Serviços Psicológicos Madison Park em Nova York, nos Estados Unidos.
Portanto, contratar um coach de divórcio é tão natural quanto "buscar consultoria financeira antes de investir o seu dinheiro".
Já os casais que preferem distanciar-se podem tentar um ano sabático — um período extenso separados que não significa o fim do relacionamento.
Terapeutas de relacionamento afirmam que têm visto um aumento desta prática em consequência da pandemia, com casais que se sentiram confinados juntos ao longo dos dois últimos anos querendo explorar uma vida solo sem se separarem.
Entre os casais decididos a se separarem, as últimas tendências de queda da economia fizeram com que eles ficassem presos um ao outro, morando juntos. Afinal, atualmente não é barato viver sozinho, nem comprar a parte de um ex-parceiro em uma moradia conjunta.
Foi o caso de Chantal Tucker, que tem 37 anos de idade e é coproprietária de um imóvel em Londres com seu ex-parceiro: "Eu sabia que nunca conseguiria comprar novamente um imóvel e a perspectiva de viver de aluguel em Londres para sempre era cada vez mais desagradável".